Se você trabalha com resíduos no estado de São Paulo, é quase certo que já tenha se deparado com a necessidade de emitir o CADRI, o Certificado de Movimentação de Resíduos de Interesse Ambiental. Esse documento é uma exigência da CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) para o transporte e destinação de determinados resíduos classificados como de interesse ambiental, os quais são listados no site do órgão ambiental. A obrigatoriedade do CADRI gera dúvidas frequentes entre empreendedores e consultores ambientais, mas uma pergunta fundamental é: de onde vem essa exigência?
É aqui que começa o problema. Segundo o site da CETESB, o CADRI foi instituído pelo Relatório à Diretoria nº 007/86/DCON, aprovado em reunião realizada em 03 de julho de 1986. Ainda de acordo com o órgão ambiental, à época, ele era denominado Certificado de Aprovação para Destinação de Resíduos Industriais, sendo posteriormente renomeado para Certificado de Movimentação de Resíduos de Interesse Ambiental pelo Decreto Estadual nº 54.645/2009, que regulamenta a Lei Estadual nº 12.300/2006, a Política Estadual de Resíduos Sólidos. Contudo, o Relatório 007/86/DCON, base dessa exigência, não está disponível publicamente no site da CETESB, gerando ainda mais incertezas sobre o processo.
O Relatório 007/86
O site Fonte Ambiental conseguiu acessar o conteúdo desse relatório por meio do Portal da Transparência. O documento, que possui cinco páginas, foi elaborado por um grupo de trabalho que buscou criar e aprovar normas internas para procedimentos e formulários voltados ao controle da poluição causada por resíduos sólidos industriais. Durante as discussões desse grupo, os temas que receberam maior atenção foram a aprovação de aterros e os planos de destinação de resíduos apresentados pelos geradores industriais.
O relatório menciona quatro processos específicos para a destinação de resíduos sólidos industriais: 1) aprovação de sistemas de destinação de resíduos no solo (SDRS), 2) aprovação de transportadoras de resíduos industriais, 3) aprovação da destinação final de resíduos, e 4) controle da destinação final desses resíduos. Foi no processo de SDRS que surgiu o termo Certificado de Aprovação para Destinação de Resíduos Industriais. Nesse contexto, o sistema de destinação só poderia receber resíduos de geradores industriais com a devida autorização da CETESB, por meio do certificado.
Já no processo de aprovação das transportadoras de resíduos industriais, também havia a previsão de uma autorização mediante certificado de aprovação, com a transportadora sendo obrigada a apresentar sua frota e detalhar as características de seu sistema de transporte. Por fim, para a aprovação da destinação final dos resíduos, a CETESB exigia que o plano incluísse a descrição dos resíduos, a transportadora e o local de destino final, sendo concedido um certificado de aprovação. Esse item é o que mais se aproxima do que conhecemos hoje como CADRI.
Alterações via Decreto
Apesar da CETESB afirmar que a mudança de nomenclatura ocorreu a partir do Decreto Estadual nº 54.645/2009, o texto do decreto menciona apenas o Artigo 25, que determina o valor de 70 UFESP (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo) para a emissão de pareceres técnicos e certificados de movimentação de resíduos de interesse ambiental. Não há, no decreto, qualquer menção à origem do nome “Certificado de Movimentação de Resíduos de Interesse Ambiental”, nem uma explicação detalhada sobre a regulamentação do CADRI.
Adicionalmente, o valor cobrado pela emissão do CADRI foi alterado pelo Decreto nº 64.512, de 03 de outubro de 2019, que vinculou o custo à quantidade de resíduos transportados. Essa variação no valor adiciona mais uma camada de complexidade ao processo.
Falta de transparência
O que fica claro é que não existe uma base legal clara e consolidada para o CADRI, nem um documento oficial que padronize quais resíduos são considerados de interesse ambiental e sujeitos à obrigatoriedade do certificado. Isso cria um cenário de incerteza tanto para empreendedores quanto para os próprios técnicos da CETESB. Em algumas situações, uma agência da companhia exige o CADRI para determinado resíduo, enquanto outra, em uma localidade diferente, não considera a mesma exigência.
Essa inconsistência leva à conclusão de que é necessária uma revisão urgente do processo de emissão do CADRI, visando a maior transparência e padronização. Com a evolução dos sistemas de gerenciamento de resíduos, como o SINIR (Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos) e o SIGOR-MTR, que garantem um controle mais rigoroso sobre a movimentação de resíduos, a revisão desse certificado seria um avanço importante para a gestão ambiental no estado de São Paulo. Isso traria mais clareza tanto para os empreendedores quanto para a própria CETESB, evitando interpretações arbitrárias e garantindo um processo mais eficaz e justo.
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Fonte Imagem de Destaque: Nathan Cima – Unplash